Saturday, 26 April 2008

Até qualquer dia.

Eu nunca gostei de despedidas...

Sempre achei que fica aquele travo na boca como se algumas palavras que devessem ter sido ditas não tivessem sido. Fica aquele nó que não desata, de uma garganta que não ousa um balbucio sequer. Não diz palavra quem se despede. E por mais que tenha dito, de nada vale para quem fica quando percebemos que tudo é finito nessa fagulhar existência. É uma inexplicável inércia. Relógios que param. Nada além disso.

Quem vai deixa sempre uma sensação de solidão, de vazio sem fim, que pensávamos só existir nas páginas da literatura. Não é bem assim, diz o autor. A vida imita a arte diz o poeta. E ficamos aqui nós, sofrendo mais do que quem se foi, perplexos naquele entreolhar febril e um arrepio desconhecido de abandono e dor. Quando alguém se vai, sem dizer adeus, ficamos com uma sensação de orfandade. Desgarrados que ficamos de quem se vai sem olhar para trás.

Hoje todos nós estamos assim. Olhar perdido num horizonte insondável, numa Fortaleza muda que foi uma paixão incalculável, nessa vida de turbilhões e furacões que aqueles que desafiam a natureza tão bem conhecem. Nesse dia nem deveríamos estar. Bastaríamos ser para sentir o coração amargurado de impotência, o espírito pálido de espanto, um torpor estranho de quem foi tomado pelo braço e atirado no escuro. Estamos cegos de ausência.

Eu nunca gostei de despedidas...
Mas quem se vai, assim, sem dizer porque, não fecha mala, não leva bagagem, não desliga o laptop, não deixa mensagem no celular, voa pra longe sem pegar avião. É por um instante pássaro, quem viveu de sonho e tinta num delírio psicodélico de Van Gogh.

Que saudade estamos nós vivendo, em mais essa prenda que nos prega essa vida... Ficamos aqui cismando sobre esta elipse desassombrada e malabarista que desferiu um daqueles homens que fazem da história uma aventura fantástica, liberta, plural, ousada, interminável, sem dúvidas ou sofismas, derramada de paixão de tal forma, que nem a morte pode estancar.

Mas quer mesmo saber? A verdade é que eu nunca gostei de despedidas... Até qualquer dia então.

Para Demócrito Dummar.