Friday 13 June 2008

O trem do tempo.

O tempo, esse inexorável trem do qual todos nós somos um pouco passageiros, trata de carregar-nos em seus vagões, através da vida, sem perguntar qual o seu destino, sem pedir bilhetes, sem dizer onde vai parar aquela viagem. Isso, que poderia ser assustador e pesaroso, pelas inúmeras dúvidas que carrega em seus trilhos, deve, a meu ver, revestir-se de magia justamente por esta característica indefinida e, certamente, jamais definitiva.

O trem avança, passando por diversas paisagens, visitando lugares de culturas diversas. Fazendo curvas amplas e fechadas. Em cada estação, pessoas te esperam, em outras não. Nas estações em que lá estão, trocam experiências, falam de suas próprias vidas, dos trens que tomaram, das suas próprias paradas, suas viagens, seus desencontros. Disso é feita essa existência. Da soma de todas essas aventuras, de todas essas viagens, paradas, pessoas, imagens, cenários, paisagens, aromas, sabores, sentimentos, lembranças. Tudo isso, maturado em nossa vivência espiritual, amalgamado em nossa alma, nos escaninhos mais profundos dela, explicará os meios, justificará os fins e mostrará, decerto, a direção a ser tomada na estação seguinte, até a derradeira, quando os trens todos já tiverem passado e não haja mais para onde ir.

Até lá é nossa missão, visitar todos os lugares e pessoas que o Criador planejou para nós, sem resistências que desencorajem, sem preconceitos que nos bloqueiem, sem reservas que assombrem o nosso aprendizado e impeçam o nosso crescimento. A vida, pois, é antes de tudo, descobrir, experienciar, sentir. Foi crendo nisso que cheguei até aqui, que percebi o clima, o ânimo, a forma de ser, ouvi as canções, comi a comida, bebi a bebida, ri do mesmo riso, abracei pessoas, fiz amigos, criei alguns inevitáveis – embora não buscados - desafetos, chorei, me debati, observei, entendi.

Se hoje deixo essa estação em busca de outro lugar, vou-me sem mágoas, agradecido, profundamente agradecido, pela acolhida, pelo agasalho, pelas palavras de fé, pelos ouvidos pacientes, pelo silêncio respeitoso, pelos sorrisos abundantes, pelos afagos sinceros, pelas orações contritas. Saio de espinha ereta, com enorme orgulho do que plantei aqui. Se não colhi o suficiente não houve culpados.

Vou-me com os olhos postos no futuro, na próxima parada, nas curvas e retas que virão à frente. Vou-me com os braços e o coração abertos para encontrar novos passageiros, novos peregrinos, novos transeuntes, novos lugares, e percebê-los a todos. Vou-me contente pelos amigos que deixo para trás, porque sei que os verdadeiros; aqueles de primeira hora, que chegam sem chamados, que entram sem bater; estes irão comigo, porque aprenderam comigo, mas principalmente me ensinaram alguma coisa e uma lição jamais pode ser esquecida. Meus amigos são aquilo que aprendi e para um apaixonado pelo conhecimento como eu, não há como separá-los de minha memória e de meu bem querer.

Mas deixa-me ir. É já que o bilheteiro está me chamando. O maquinista apita. A locomotiva resfolega ruidosa, rodas de ferro tinem nos trilhos. Embarco sereno. No peito aquela sensação de dever cumprido. A busca de novos desafios me provoca. É dada a hora de partir. Abro a janela, puxo a cortina. O vento bate no meu rosto. Cerro a vista. Partimos. Para trás uma cidade, uma silhueta que vai se distanciando até sua importância ficar longe, e longe, e longe...

Boa sorte. Fiquem com Deus e até qualquer dia.